A pouco mais de três semanas da realização da próxima Cúpula de Líderes do G20, em 9 e 10 de setembro, um grupo de organizações internacionais divulgou hoje um estudo mostrando que, só no ano passado, os países do grupo econômico gastaram US$ 1,4 trilhão para apoiar combustíveis fósseis.
Segundo o documento “Fanning the Flames: G20”, a cifra já é considerada o valor mais alto da história e inclui subsídios a combustíveis fósseis (US$ 1 trilhão), investimentos de empresas estatais (US$ 322 bilhões) e empréstimos de instituições financeiras públicas (US$ 50 bilhões). “É mais do que o dobro dos níveis pré-COVID-19 e pré-crise energética de 2019”, informa o texto assinado pelo Instituto Internacional para o Desenvolvimento Sustentável (IISD) e instituições parceiras de diversos países, sendo no Brasil, o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos).
Se o dinheiro público não estivesse bancando benefícios fiscais às petroleiras e demais participantes da cadeia do carvão, petróleo e gás, os membros do G20 não só ganhariam US$ 1,4 trilhão, como também poderiam receber US$ 1 trilhão adicionalmente por ano ao taxar esse segmento cobrando entre US$ 25 a 50 para cada tonelada de CO2 emitida na atmosfera. Esses recursos poderiam ajudar a resolver alguns dos problemas globais mais urgentes, como o combate à fome, por exemplo.
“Esses números são um lembrete gritante das enormes quantidades de dinheiro público que os governos do G20 continuam investindo em combustíveis fósseis, apesar dos impactos cada vez mais devastadores das mudanças climáticas”, disse Tara Laan, analista sênior do IISD e principal autora do estudo. Para ela, o G20 tem o poder e a responsabilidade de transformar nossos sistemas de energia baseados em fósseis. “É crucial que o bloco coloque subsídios aos combustíveis fósseis na agenda da Cúpula de Líderes de Delhi e tome ações significativas para eliminar todos os fluxos financeiros públicos de carvão, petróleo e gás. ”
Livi Gerbase, assessora política do Inesc, alerta que os membros do G20 cobram menos impostos sobre combustíveis fósseis se comparado a outros emissores de CO2 —uma média de apenas US$ 3,2 por tonelada de CO2 emitido, a despeito de as empresas de carvão, petróleo e gás terem registrado lucros recordes no ano passado no auge da crise energética.
“Reduzir artificialmente o preço dos combustíveis fósseis com subsídios não apenas incentiva sua queima, intensificando as crises climáticas como ondas de calor, incêndios florestais, chuvas intensas, como também atrasa o desenvolvimento de outras matrizes energéticas limpas”, explica Livi.
A assessora do Inesc ainda alertou que o fomento aos combustíveis fósseis no Brasil alcançou R$ 118,2 bilhões em 2021, um valor próximo ao registrado no ano anterior. Para 2022, a expectativa é que a quantia seja maior, pois foram zeradas as alíquotas do PIS, da Cofins, do PIS-Importação e da Cofins importação sobre combustíveis fósseis.
Os autores do estudo recomendam que os membros do G20 estabeleçam um prazo claro para eliminar os subsídios aos combustíveis fósseis — 2025, para países desenvolvidos; e até 2030, para economias emergentes — caso queiram cumprir o compromisso assumido em 2009 de reformar os subsídios.
Além disso, o G20 deveria deixar de usar o qualificador “ineficiente” para subsídios. Essa classificação deveria ser substituída pela indicação de casos excepcionais nos quais subsídios podem ser considerados justificáveis – por exemplo, se forem essenciais para o acesso à energia – e melhoria no direcionamento desses subsídios para incluir as pessoas que realmente precisam deles.
O IISD e as organizações especialistas destacam ainda que existem maneiras melhores de apoiar as pessoas durante uma crise e que os subsídios aos combustíveis são, na verdade, uma forma notoriamente ineficiente de ajudar os pobres. “Os governos devem fornecer bem-estar social por meio de outros mecanismos, como pagamentos direcionados à previdência social”, aponta o estudo.
O relatório destaca o notável progresso de alguns membros do G20 nessa área, como é o caso da Índia, atual presidente do bloco, que reduziu seus subsídios aos combustíveis fósseis em 76% de 2014 a 2022, ao mesmo tempo em que aumentou significativamente o apoio à energia limpa.
Especialistas observam que transferir menos de um quarto dos US$ 2,4 trilhões gerados pela reforma nas políticas de subsídios e com a tributação do carbono poderia ajudar a fechar a lacuna de investimento em energia eólica e solar — US$ 450 bilhões por ano até 2030 — para limitar o aumento da temperatura global a 1,5°C, com o apoio público aproveitando fundos adicionais de investidores privados.
Os recursos também poderiam ser usados para ajudar a acabar com a fome no mundo (US$ 33 bilhões/ano), fornecendo acesso universal à eletricidade e à culinária limpa em todo o mundo, de forma alinhada com emissões líquidas zero (US$ 36 bilhões/ano). Isso significa fechar a lacuna de financiamento climático que os países desenvolvidos se comprometeram a mobilizar para as nações em desenvolvimento (US$ 17 bilhões/ano).
“A remoção dos subsídios salvaria milhares de vidas ao reduzir a poluição do ar relacionada a combustíveis fósseis, responsável por mais de cinco milhões de mortes por ano nos membros do G20 e uma em cada cinco mortes em todo o mundo”, contabiliza a análise da IISD.
O estudo enfatiza o papel ativo que precisa ser desempenhado pelas empresas estatais, que dominam o cenário energético em muitos países membros do G20, e pelas instituições financeiras públicas, que concedem empréstimos consideráveis para projetos de energia fóssil. Os governos devem, em particular, estabelecer um prazo para que essas instituições estatais criem roteiros ambiciosos de zero emissões líquidas que lhes permitam diversificar seus negócios e carteiras de empréstimos e evitar os riscos inerentes aos investimentos contínuos em combustíveis fósseis, como ativos perdidos.
“Com as empresas de combustíveis fósseis obtendo lucros recordes em meio à crise energética do ano passado, há pouco incentivo para que elas mudem seus modelos de negócios de acordo com o que é necessário para limitar o aquecimento global. Mas os governos têm o poder de empurrá-los na direção certa”, lamenta a associada sênior do IISD.
Para ver o estudo na íntegra, acesse: https://www.iisd.org/publications/report/fanning-flames-g20-support-of-fossil-fuels
Por Redação