Na última quarta-feira (28), representantes de organizações da sociedade civil, empresas, investidores sociais e lideranças de ESG estiveram na sede da Bolsa de Valores para debater o papel de cada um desses setores para uma atuação conjunta, visando o desenvolvimento de ações de impacto para um Brasil mais justo e inclusivo. Não foi uma discussão de fórmulas prontas.
Minutos antes, o auditório da B3, em São Paulo, havia sido palco da apresentação da pesquisa “Varejo com Causa: como as redes varejistas impulsionam a cultura da doação no Brasil”, encomendada pela MOL Impacto, elaborada MindMiners, com o patrocínio da B3 Social e da consultoria PwC Brasil.
Segundo o estudo, o varejo tem assistido a um número cada vez maior de experiências para promover a doação a causas sociais no ato da compra. O perfil de consumidor filantropo não só contribui com esse tipo de campanha em supermercados e farmácias, mas também realiza doações fora desses ambientes. Para 80% dos que doam na boca do caixa, quando uma empresa promove essa ação, há um ganho significativo para a imagem da marca. (Veja resultados abaixo)
Apesar de a pesquisa ter mostrado que a doação no checkout é bem-vista pelos clientes, isso não é suficiente para incentivar as empresas de varejo a adotar a prática nos seus estabelecimentos. O estudo da MOL alertou que 70% dos consumidores simplesmente não doam porque não são abordados na loja ou veem essa possibilidade no caixa. Para piorar, metade dos varejistas acredita que pedir ao consumidor para fazer uma doação ou é um incômodo (33%) ou se trata de um processo complicado para ser implementado na empresa (17%).
De fato, há muitos desafios para unir as marcas e as causas de organizações sociais, por meio do varejo. No debate, o co-fundador da MOL Impacto, Rodrigo Pipponzi, explicou que para engajar este setor às práticas de responsabilidade social existem três caminhos: por constrangimento, coerência ou convicção.
“No caso do constrangimento, é necessário convencimento mesmo, insistência de gente mostrando a ele que é possível fazer. É como aconteceu há 30 anos, quando ninguém usava cinto de segurança. Há uma resistência no início, mas, depois, todo mundo entende a importância e não questiona mais. A consciência da sociedade em relação ao impacto social também vai evoluir e mais pessoas e marcas entenderão a necessidade da doação e o poder de transformação dela”, disse.
Na roda de conversa, também participaram Luciana Medeiros, sócia da PwC e líder da indústria de varejo e consumo no Brasil; Leandro Machado, sócio e cofundador da Cause; Ana Buchaim, vice-presidente de Pessoas, Marketing, Comunicação, Sustentabilidade e Investimento Social da B3; e Gustavo Narciso, gerente-executivo do instituto C&A.
Esse último trouxe a experiência da C&A com a venda do produto social “Por uma vida mais colorida”, livro desenvolvido em parceria com a MOL Impacto. A publicação contém 30 cartões destacáveis com mensagens de autoestima e diversidade para quem ama moda. “O livro completa a experiência positiva de compra, pois as clientes gostam de saber que a marca tem um produto que gera impacto social”, explica ele. “Até os semblantes delas mudavam para melhor quando ouviam sobre a iniciativa no caixa.”
A reação das consumidoras da C&A descrita por Narciso não surpreende a vice-presidente de Investimento Social da B3. Segundo ela, do mesmo modo que os investidores do mercado financeiro e de capitais buscam empresas com boas práticas e boa reputação, esse comportamento também se reflete nos consumidores do varejo. “Eles valorizam as empresas e estabelecimentos que se mostram socialmente comprometidos”, reforça Ana Buchaim.
A pesquisa – A apresentação do estudo foi conduzida por Roberta Faria, CEO da Mol Impacto, que abriu o encontro explicando a motivação de se fazer uma pesquisa com o varejo.
Para ela, trata-se de um segmento onde é possível se comunicar com um volume imenso de pessoas ao mesmo tempo. “Os projetos de doação dentro de cenários como esse fazem exatamente isso: comunicam e levam um benefício enorme, principalmente, para o negócio”, diz. “Quando você acrescenta uma camada de informação positiva no rótulo de uma mercadoria, isso gera valor de marca, valor de negócio e valor para os seus produtos”, acrescenta a executiva.
A seguir, as principais conclusões do estudo “Varejo com Causa: como as redes varejistas impulsionam a cultura da doação no Brasil”:
- A preocupação com questões sociais e ambientais é uma realidade para a maioria dos participantes do estudo. Conforme a pesquisa, sete em cada dez consumidores dizem estar preocupados com questões socioambientais, 69% dos entrevistados expressam apreensão em relação a temas como fome, violência, saúde, desigualdade social, aquecimento global e educação. Entre os doadores do varejo mencionados, a preocupação com essas questões atinge 86%.
- Além de serem mais conscientes, os doadores do varejo também se mostram mais generosos. O levantamento revelou que nos últimos 12 meses eles doaram, em média, R$197,90, o que representa um aumento de 44% em comparação com os entrevistados que fizeram suas contribuições fora do ponto de venda. Entre as causas mais beneficiadas estão o acolhimento e proteção aos animais abandonados (57%) e a proteção aos direitos e cuidados da infância e adolescência (33%).
- A maneira como as pessoas expressam sua solidariedade também varia, embora a maioria faça doações principalmente em supermercados e farmácias, um número significativo de consumidores afirmou ter doado em outros tipos de estabelecimentos, em comparação com os resultados anteriores. Alguns exemplos incluem lojas de roupas, calçados e artigos esportivos (aumento de 14 pontos percentuais), lojas de departamento e produtos para casa (aumento de 13 pontos percentuais) e restaurantes (aumento de 9 pontos percentuais).
- O varejo tem espaço para explorar essa tendência. Apesar do interesse dos clientes em se envolver com marcas que têm um propósito além do lucro, menos da metade dos profissionais do varejo afirma que a empresa oferece mecanismos de doação para causas sociais e ambientais (48%), o que indica uma grande oportunidade de crescimento.
- Entre aqueles que oferecem tais mecanismos, 66% são drogarias e perfumarias, 58% são lojas de eletrodomésticos, 54% são lojas de departamento e 46% são supermercados. Quanto aos tipos de doação oferecidos, 29% trabalham com marketing social, 27% com doação de bens materiais em pontos de coleta, 26% com produtos sociais, 25% com solicitação de doações sem valor específico e 24% com arredondamento de troco, entre outras formas.
- A pesquisa também indica que oferecer mecanismos de doação no ponto de venda pode melhorar a imagem da empresa e aumentar a fidelidade dos clientes. Segundo o estudo, sete em cada dez consumidores têm uma visão positiva da iniciativa de doação realizada no caixa. Além disso, 80% dos doadores do varejo acreditam que promover a doação melhora a imagem da loja, e 85% deles comprariam novamente no estabelecimento se soubessem que podem fazer doações.
- Sobre a prestação de contas, 97% dos consumidores dizem se sentir estimulados a doar novamente sabendo do impacto gerado pela contribuição e apenas 57% dos doadores no varejo sabem como o dinheiro foi usado.
Para os debatedores, os resultados acima comprovaram a relevância do engajamento do varejo em questões sociais e ambientais. Os consumidores estão, sim, mais conscientes e dispostos a apoiar iniciativas que visam promover o bem-estar da sociedade e do planeta.
Por isso, oferecer mecanismos de doação no ponto de venda não só contribui para causas nobres, mas também fortalece a imagem da empresa e aumenta a fidelidade dos clientes.
Em resumo, constatou-se uma enorme oportunidade para o varejo se conectar com seus consumidores de uma maneira significativa e fazer a diferença na comunidade.
(Pietra Nóbrega, da Agência Pauta Social)